segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Psicologia do Desenvolvimento( Peça de Nelson Rodrigues)

Nelson Rodrigues, um grande escritor brasileiro, escreveu uma peça intitulada Perdoa-me por me traíres, que é classificada como uma tragédia carioca, que retrata a história de uma adolescente de dezesseis anos de classe média.  Glorinha era criada dês de criança pelo Tio Raul, irmão de seu pai, e por sua esposa Tia Odete, porém essa era uma louca que apenas murmurava algumas palavras. A moça acreditava que sua mãe tinha se suicidado, ela admirava o ato da mãe que partir enquanto era bela e cheia de vida em seu esplendor, com a morte de sua mãe seu pai enlouquecera e passara a viver em uma casa de repouso.  Sua melhor amiga era Nair, moça bonita, muito inteligente, namoradeira e moderna para a época.  Essa vivia cabulando a aula para ganhar dinheiro em um bordel de Madame Luba, que tinha uma casa só de adolescentes para políticos e pessoas ricas da sociedade carioca. 
Assim inicia a peça com Nair chamando Glorinha para conhecer Madame Luba, que o negocio é batata, que ela vai gostar. Glorinha se arruma toda e se diz muito curiosa e interessada em ir, porém no meio do caminho entra em pânico ao lembrar do Tio, ela diz que o tio nunca permitiria, que tinha de ir para casa, que o Tio só a deixa ir de casa para o colégio e nada mais. Que ela tem muito medo do tio, e se ele descobre, ela a matava. Nair diz que isso é bobagem que ninguém irá saber, a arrastando a casa da Madame Luba. Glorinha titubeia a aceitar a proposta de Madame, Nair a convence dizendo que aquele medo todo dela era mentirá, que no fundo ela queria:
Nair- Que máscara é essa?
Glorinha- Por quer Máscara?
Nair- Máscara sim senhora! (…) E aquela farra que nós fizemos, nós duas.
Glorinha- Sei lá de Farra!
Nair- No carnaval, esse que passou! Madame, fomos com uma turma ao apartamento de um cara. E lá, sabe como é: bebemos, pintamos o caneco. A Glorinha estava com uma fantasia sem alça em cima da pele! Veio um engraçadinho e , pela costas, te puxou o fecho ecler até embaixo. Ficou pelada, Madame.
Glorinha- Eu estava de pileque  Madame! Tanto que nem me lembrava. (…) Olha até agora não passei do beijo.  (RODRIGUES, 2003,p.786)

           
Algo interessante de retratar-se nessa peça são as vestimentas de Glorinha ,sempre de menina: com vestidos, sais rodadas. Ao início observasse o seu pudor e temor quanto a sua própria sexualidade, que aflora intensamente e ela nega sua existência, dessas pulsões que a assalta de rompante, mas Nair lhe apresenta esse desejo na sua cara, ela nega dizendo ser mentira da amiga. Nesse Tio de Glorinha encontramos todo um investimento libidinal, próprio da adolescência que re-edita esse complexo de Édipo, frente a essa figura paterna, tão desejada e repugnada pela culpa, devido a lei.
Logo em seguida chega o deputado, vizinho de Glorinha que deseja ter com ela, Madame Luba ameaça chamar o Tio da jovem se ela não encontra o deputado explicando que não vai ocorrer nada, e ela ganhará muito dinheiro. O deputado é DR. Jubileu um homem já idoso.  Ao fica sozinha com o deputado Glorinha entra em pânico, com aquele homem a agarrando, ela pede que ele a solte, ela a agarra com mais força e começa a berrar : “As duas modalidades de eletrização que podemos observar nos corpos correspondem às duas espécies de carga elétrica encontradas no átomo. (mudando de tom, num apelo soluçante) Não se mexa: fique assim!”(RODRIGUES,2003.p.789) Glorinha repele o deputado, em gritos de ira diz que quer ir embora, que ele é louco e sujo. Ele explica que o que ele fala é pura física que ela basta ficar quietinha enquanto ele fala. Ela não aceita. Então ele chama o funcionário de Madame Luba, Pola Negri para segurar a menina enquanto ele realiza suas fantasias sexuais. Ela fica totalmente presa enquanto, o Pola fica a repetir que ela adora o deputado, o deputado continua a repetir suas lamurias da física, até : “ Finalmente, o DR. Jubileu cai de joelhos, porque alcança o máximo da tensão. Assim de joelhos, mergulha o rosto nas duas mãos e tem um soluço interminável, grosso como um mugido.” (RODRIGUES,2003.p799). Nesse momento Glorinha é liberta que cai sobre uma cadeira em prantos.
Nessa cena é bem claro, esse encontro com o real do sexo, que é na verdade um desencontro traumático. Esse real paralisa Glorinha, essa se ver sem reação, tomada pela angustia, ela se debate contra essa cena, do buraco ao qual ela se ver frente à frente e não consegue simbolizar, representar. Esse real que se configura na imagem do deputado, tomado pelos efeitos do real no corpo da velhice, que está a se decompor, perdendo sua virilidade e vigor.
            Depois de Glorinha e Nair sair da casa de Madame Luba, Glorinha afirma que não ocorreu nada demais, mas que não sabe tem medo, muito medo, e sente o mesmo quando ta namorando, sente um terror dentro dela. Nair diz que ela tem medo é do tio, Glorinha afirma que sim que teme o tio, e que pensa nele em tudo que ela faz. Nair conta que está grávida, que tem de ir a um médico para tirar a criança, pede que a amiga a acompanhe. Glorinha diz que não pode por causa do tio, mas termina indo. Nair diz que tem medo de morrer sozinha, e que antes de morrer quer ser beijada, pedindo que Glorinha der esse beijo se ela for morrer. Durante o procedimento médico Nair perde muito sangue, diz estar fraca, grita que vai morre, Glorinha começa a chorar, e diz que tem de ir embora, o médico manda que ela vá embora, Nair suplica que ela fique e lhe beije. Glorinha grita qaunto sangue, num berro diz não me falem em morte e vai embora.
            Logo em seguida encontramos essa aproximação da sexualidade com a morte, dessa amiga que a convida a partilha esse prazer do além do principio do prazer, de se viabilizar por outra via que não a do desejo, mas desse gozo advindo da pulsão de morte. Porém frente a esse real novamente Glorinha foge dele, tenta escapar a todo custo. Buscando no Tio, essa lei que impossibilita esse gozo, colocando uma barra no campo do Outro.
            Ao final da peça, o Tio Raul descobre do aborto da amiga de Glorinha, e que essa tinha ido se encontrar com um Deputado em um bordel. Em meio a essa discussão ardente entre o tio e a sobrinha, esse diz que matou a mãe dela com veneno, e que todos pensam que ela se matou, mas é mentirá, ela a tinha matado pois ela tinha um amante, o traindo, e mesmo com um amante o rejeito, logo ele que a amava.  Ele diz que criou Glorinha para ser dele, mas que agora ela era imunda e devia morrer como a mãe. Ele pergunta se ela o odeio se tem nojo dele, a ameaçando para dizer que sim.
Tio Raul – Tu me odeias?
Glorinha – Não
Tio Raul – Não, odeias o assassino da tua mãe?
Glorinha – Não.
Tio Raul – Mentirosa.
Glorinha – Pois odeio, pronto odeio. (RODRIGUES,2003.p.819)

            Depois ela relata o ocorrido de Madame Luba, que tinha sentido nojo que ele era gagá. O tio diz que ela mente, então ela diz que tinha gostado que ele era novo, que parecia com o tio, era bonito e forte como ele, e falou em voz baixa que tinha pensado tanto no tio durante o incidente. Ao final o tio diz está satisfeito e pergunta a ela se ela não deseja dizer mais nada. Ela disse que só falou o que o tio mandou, mas a verdade é que o deputado era velho e tinha nojo dele, mas do tio ela gostava e não tinha nojo. Ela pede que antes de morrer que o tio a beije, ele beija sua testa ela pede que beije sua boca. Eles se beijam fortemente. O tio pergunta se o beijo foi só por medo para que ele não a mete. Porém Glorinha afirma que o ama, só a ele e sempre e que morrer com ele. Glorinha faz o tio tomar o veneno e faz de conta que tomou também. De repente ela passa a ver-lo como um velho, parecia com o deputado, ela tem nojo. Ela termina a peça correndo para sair da casa.
            Por meio desses diálogos podemos observar a questão da ambivalência do adolescente, frente a esse pai amado e odiado, do retorno do Édipo.  Porém agora o corpo biologicamente pode atuar o desejo edipiano, contudo devido ao recalque esse não se realiza, ocorrendo um deslocamento desse objeto de amor. Assim Glorinha ao seu modo efetua essa castração e resolução do complexo de Édipo, mesmo que essa tenha sido em uma passagem ao ato de matar esse pai.