segunda-feira, 11 de abril de 2011

Análise da tragédia grega Édipo Rei de Sófocles:


As tragédias diferentes das lendas heróicas que glorificavam os heróis, vem não mais para exaltá-los mais para discuti-los publicamente, em nome de um ideal cívico, diante de uma assembléia publica que era o teatro grego. Todas essas modificações têm um reflexo do momento e de como estava a sociedade grega, que vem com a chegada do direito e das instituições da vida publica que questionavam as questões moreis e religiosas da Grécia. A tragédia surgiu no final do século VI a.C.
Em Nietzsche (1992) encontramos uma valorização da arte, pois essa não nega a vontade de potência do homem e suas pulsões, apenas acrescenta beleza e estética ao caos, intensificando a vida. A tragédia é bela, permite unir a aparência e a essência.Nesse período da tragédia grega temos uma assunção da natureza física e contraditória, do corpóreo do homem, e esse é perecível.
A tragédia pode ser pensada para além das suas formas e harmonias estéticas, segundo o pensamento de Nietzsche (1992). A tragédia nasceu sobre o confronto e a conciliação de dois impulsos artísticos da natureza o dionisíaco e a apolíneo. Dionísio é o oposto da civilização, sendo um deus de origem asiático, ele expressa o culto da experiência do limite da civilização. Assim o impulso ou potência dionisíaca é o limite da cultura, sendo assim uma potência da embriagez, da desmedida, da música, da dança e do transe.  Já o Apolo é toda a harmonia e estética, sendo a potência onírica, figurativa e imagética. Com esse pensamento Nietzsche (1992) quebra com todo o pensamento moral e da virtude do homem, pois esse não se constituiu só do elevado, mas da dinâmica entre o mais baixo e miserável (o pulsional e corporal) ao mais alto e grandioso.
Por meio da leitura de Machado (1999) a arte apolínea é a arte da estética e beleza, onde para os gregos a beleza significava medica, proporção, ordem, delimitação, forma, harmonia, calma e serenidade. Logo na natureza não existia a beleza, essa é uma construção, sendo uma aparência, um fenômeno, uma tentativa de encobrir e mascarar a verdade essencial do mundo. Através da arte trágica encontramos a união da aparência e da essência, articulando duas pulsões artísticas da natureza, não se prendendo como a poesia épica apenas a aparência e a forma, a tragédia vai além da estética e beleza é também composta de uma imagem dionisíaca, trazendo uma experiência trágica da essência do mundo.
A relação trágica da vida ocorre com a capacidade do homem de afirma a sua vida e existência com tudo que a compõe da altivez ao mais corpóreo e miserável, relacionando assim com o limite e com o oposto da cultura. Assim para Nietzsche (1992) a tragédia é uma afirmação da vida, onde o homem busca em sua mortalidade uma força. Colocando assim as três instancia da existência humana, ou seja, três instancias da tragédia. Que seriam o limite (métron) a desmedida (hýbris) e os sofrimentos (páthos). Os homens não podem e não deveriam ultrapassar os limites, porém os homens não seriam humanos se não transgredisse esse limite. Assim que cometem uma desmedida são acometidos de um sofrimento, os atos dos homens têm conseqüências que retornam aos mesmos.
Para Nietzsche (1992) a civilização se constitui sobre a barbárie, na cultura grega arcaica se encontra não uma negação desse bárbaro pela supremacia da civilização, mas uma assimilação. Desse modo o caos e a ordem vivem em tenso equilíbrio do apolíneo, do belo, do ordenado e aparente contra o dionisíaco do caos e do fundo.  Assim as tragédias são atravessadas como a existência humana de caos e ordem.
O grego arcaico se via diante de um grande pessimismo da sua existência miserável, onde o grande desejo se fundava no nada ser, logo esse bem é inacessível, assim vem o desespero, pois o maior bem não se pode acessar, esse seria o não nascer.
Em regada desse contexto, a arte se origina nessa grande polemica da existência, assim nasce de uma necessidade de vida, a arte apolínea dos textos homéricos. Pois apesar do pessimismo a vida é luta constante, um jogo de forças, que não se finda. Logo pela sua força pela vida, de potencia, o grego precisou com a arte mascarar o terror. E assim conseguiu por meio da beleza, da ordem e da estética, da harmonia. Um embelezamento com Apolo. Porem se contra põem nesse jogo de forças a potencia dionisíaca, do instinto, da desmesura, da destruição, do caos encontrando assim o que funda a embriagez. Nascendo assim nesse contexto a tragédia grega é a síntese dessas forças opostas, aonde o dionisíaco e o apolíneo não devem ser separados, pois um completa o outro, afirmam-se mutuamente.
Na obra o nascimento da tragédia podemos compreender que as pulsões apolínea estão nos diálogos, chegando a superfície, são transparentes e belos. O dialogo é a forte característica dos povos helênicos, ao longo da obra de Sófocles Édipo Rei podemos observa que a linguagem dos personagens são eruditas, claras, precisas e com todo um desejo estético de estruturação.
Segundo Nietzsche (1992) a mais dolorosa imagem da cultura grega dói, Édipo, pois esse era uma pessoa nobre, porém apesar de sua sabedoria e virtudes, estava predestinado ao erro e à miséria humana dê do nascimento.  Édipo ao longo da peça vai desfazendo laço por laço do seu caminho levando a sua própria perdição. Isso podemos analisar ao longo das investigações que esse deseja continuar, apesar de muitos lhe persuadirem a parar, ele não para até chegou a grande descoberta da sua miséria humana de matar o pai e dormir com a mãe. Partindo do pensamento desse filosofo encontramos uma dialética entre o decifrador da natureza se entrelaçando com o transgressor da mesma, uma vez que o grande sábio da natureza e dos enigmas termina ultrapassando o limite – a natureza – rompendo com o mesmo, sendo o assassino do pai e amante da mãe. Com esse rompimento lhe recai o sofrimento as conseqüências, sua mãe - esposa se suicida, ele fura os olhos e vive em sua eterna miséria na escuridão.  Assim podemos coincidirá que a sabedoria dionisíaca seria um horror antinatural, caminhando assim no limite do abismo da destruição, sentindo assim o próprio sábio dionisíaco a destruição de si próprio.
Édipo ao fim das suas investigações é tomado por um saber dionisíaco que o coloca de frente com os limites e com sua transgressão, recaindo sobre esse um sofrimento e um horror de si mesmo, que esse destrói a si mesmo, sem suportar a potência desse saber ele fura os olhos para não, mas poder ver esse abismo de destruição em que ele caiu sobre os limites transgredidos.   
Freud (2001) em seus trabalhos evoca a antiga lenda grega de Édipo lhe dando uma importância fundamental para a formação subjetiva do ser humano e colocando uma nova interpretação do mito por meio do saber psicanalítico, na qual ver no amor da criança por um de seus pais e o ódio para com o outro, sendo o nó primordial para a construção de uma neurose. Tal complexo ocorreria tantos nos ditos normais neuróticos como nos com outras estruturas psíquicas.
A interpretação de Édipo não se constitui um grande enigma, uma vez que seus significados se apresentam de modo bem claro, ao longo do mito. Segundo Freud (2002) essa tragédia é universal ao ser humano e as construções psíquica das crianças, que passam por desejos e tendências semelhantes à trama vivenciada pelo herói Édipo.  Assim não carregaríamos como Édipo uma maldição divina, uma onipotência divina sobre a vontade dos homens, uma vez que Édipo desejava fugir de seu destino. Carregamos sim nossa própria maldição proveniente de nossos próprios desejos de tomar o lugar do pai e esposar a mãe só para si, porém quando crescemos esquecemos esse desejo infantil deixando-o como coloca Freud (2002) recalcado no inconsciente. Desse modo, ler essa tragédia é se depara sobre o véu que encobre nossa própria verdade, revelando nós mesmos, no encontro com o mito, seria um reencontro com os desejos infantis não realizados. Assim na tragédia teremos a realização de nossos sonhos e desejos inconscientes, porém ao longo da obra também surgem os horrores e a culpa pela realização ou pelo simples fato da existência desse desejo, emergindo ai o poder da censura e da cultura (ordem e lei). 
A tragédia é formada de diversas ambigüidades, tensões e contradições de conflitos, aonde o plano dos homens e dos deuses são radicalmente opostos, para que assim esses possam se opor, e a transgressão tome uma imagem clara. Em Édipo Rei, encontramos uma diferença bem clara do que caberia aos deuses, em especial Apolo e seus enigmas e maldições, e o mundo dos homens perene e submetido às vontades dos Deuses. O sacerdote no seu discurso deixa bem claro que os homens não se igualam aos deuses e o único homem mais próximo dele é Édipo, porém esse ao se depara com esse limite acaba transgredindo o mesmo e sofrendo uma forte conseqüência, que termina por ser sua miséria e cegueira.
 “O domínio próprio da tragédia situa se nesta zona fronteiriça, onde os atos humanos vêm articular-se com as potências divinas, onde eles revelam seu sentido verdadeiro, ignorado por aqueles que tomaram a iniciativa e carregaram a responsabilidade deles, inserido-se numa ordem que ultrapassa o homem e lhe escapa.”(VERNANT e VIDAL-NAQUET, 2005. p. 58)

            Podemos perceber que toda a perdição do herói tem uma marca no seu caráter muito seguro de si mesmo, no seu julgamento, poder e orgulho pretendendo sempre ser o único e primeiro, logo não poderia admitir um erro, ou que se parasse a investigação ele tinha de desvendar a verdade. Édipo colocava sempre as investigações à frente na perspectiva de descobrir que seu rival Creonte seria o culpado. Sobre Creonte o herói projeta sua sede e desejo de poder. Consumido por esses desejos, o decifrador dos enigmas se ver enquanto rei como cego, sendo incapaz de decifrar esse enigma que é posto da sua origem e quem matou Laio.
            Ao Final da tragédia encontramos toda a ambivalência da peça e desse estilo literário, devemos salientar aqui as palavras de Jocasta já prevendo o resultado dos enigmas onde em sua própria fala se tem à contradição fundamental de Édipo ao dizer que infeliz seja seu marido e nunca saiba quem ele é. Nessa tragédia também encontramos a lei da proibição do incesto e do parricídio, e toda a miséria e mal para aqueles que subvertem a lei, ou seja, ultrapassem os limites.
            Uma análise bem fundamentada sobre a interpretação dessa obra é feita por Vernant e Vidal-Naquet (2005) :
Édipo é duplo como a palavra do oráculo: rei salvador a quem, no início da peça, todo o povo implora, como se dirigisse a um deus que tem nas suas mãos o destino da sua cidade; mas também poluição abominável, mostro de impureza, que concentra em si todo o mal, todo o sacrilégio do mundo, e que é preciso expulsar como um pharmakós, um bode expiatório, para que a cidade, de novo pura, seja salva. ( P. 67)




Bibliografia:

FREUD, Sigmund. A interpretação dos sonhos.Tradução de Walderedo Ismael de Oliveira. Rio de Janeiro: Imago,2001.

FREUD, Sigmund. Três ensaios sobre a teoria da sexualidade. Tradução Paulo Dias Corrêa. Rio de Janeiro: Imago, 2002.

MACHADO, Roberto. Nietzsche e a verdade. São Paulo: Paz e Terra, 1999.

NIETZSCHE, Friedrich. O nascimento da tragédia ou helenismo e pessimismo.  Tradução J. Guinsburg. São Paulo: companhia das letras,1992.

SÓFOCLES. Édipo Rei. Tradução de Paulo Neves. Porto Alegre: L&PM,2006.

VARNANT, Jean-Pierre e VIDAL-NAQUET, Pierre. Mito e tragédia na Grécia antiga. São Paulo: Perspectiva,2005.

2 comentários:

  1. Gostei bastante do Blog, :)
    Muito interessante !
    Deixo o meu aqui, caso queira dar uma olhada, seguir...;

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    Muito Obrigada, desde já !

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  2. Obrigada por sua visita... Entre aqui sempre que seu desejo a mover a esse alfarrábio.

    Volte sempre que desejar.
    Abraços

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